29 de maio de 2008

A caricia perdida


Sai-me dos dedos a carícia sem causa,
Sai-me dos dedos... No vento, ao passar,
A carícia que vaga sem destino nem fim,
A carícia perdida, quem a recolherá?
Posso amar esta noite com piedade infinita,
Posso amar ao primeiro que conseguir chegar.
Ninguém chega. Estão sós os floridos caminhos.
A carícia perdida, andará... andará...
Se nos olhos te beijarem esta noite, viajante,
Se estremece os ramos um doce suspirar,
Se te aperta os dedos uma mão pequena
Que te toma e te deixa, que te engana e se vai.
Se não vês essa mão, nem essa boca que beija,
Se é o ar quem tece a ilusão de beijar,
Ah, viajante, que tens como o céu os olhos,
No vento fundida, me reconhecerás?

Alfonsina Storni - (Tradução de Carlos Seabra)

12 de maio de 2008

Geometria dos corpos


A menor distância
entre dois pontos
está na conjunção
de nossos corpos
que se atraem na razão inversa
da razão e do verso.

Beija meus senos
percorre minha hipotenusa
para te perderes no triângulo
molhado sob minhas bermudas
e descobrir minhas incógnitas
me rasgando com teu cateto.

Encaixa teu cilindro
em meu cone que te precisa
e acha, usa e abusa,
descobre o meu ponto G...

Encontra a quadratura do círculo
na curva de meus quadris.

Camila Sintra


9 de maio de 2008

Seios


O branco
todo alvo
realça na pele bronze

No alvo, círculo rosado
ao centro um olho
pedinte, esbugalhado

Todo ele na palma da mão
na tua mão encaixado
faminto se enrijece
sedento pede tua língua
afoito geme ao contato
feito coito alucinado

Os dois são felicidade
nas tuas mãos e cuidados
bichos presos, enjaulados
não querendo liberdade

Isabel Machado

A tua voz na primavera


Manto de seda azul, o céu reflete
Quanta alegria na minha alma vai!
Tenho os meus lábios úmidos: tomai
A flor e o mel que a vida nos promete!

Sinfonia de luz meu corpo não repete
O ritmo e a cor dum mesmo beijo... olhai!
Iguala o sol que sempre às ondas cai,
Sem que a visão dos poentes se complete!

Meus pequeninos seios cor-de-rosa,
Se os roça ou prende a tua mão nervosa,
Têm a firmeza elástica dos gamos...

Para os teus beijos, sensual, flori!
E amendoeira em flor, só ofereço os ramos,
Só me exalto e sou linda para ti!


Florbela Espanca

Teu corpo seja brasa


teu corpo seja brasa
e o meu a casa
que se consome no fogo

um incêndio basta
pra consumar esse jogo
uma fogueira chega
pra eu brincar de novo

Alice Ruiz

Objeto de amor


De tal ordem é e tão precioso
o que devo dizer-lhes
que não posso guardá-lo
sem a sensação de um roubo:
cu é lindo!
Fazei o que puderdes com esta dádiva.
Quanto a mim dou graças
pelo que agora sei
e, mais que perdôo, eu amo.
Adélia Prado